Contextualização
q Integração
de Mensagem no universo poético Pessoano:
Integra-se na corrente
modernista, transmitindo uma visão épico-lírica do destino português, nela se
salientando o Sebastianismo, o Mito do Encoberto e o V Império.
“Criar um novo Portugal,
ou melhor, ressuscitar a Pátria Portuguesa, arrancando-a do túmulo onde a
sepultaram alguns séculos de obscuridade (...) E isto leva a crer que deve
estar para breve o inevitável aparecimento do poeta ou poetas supremos [...]
porque fatalmente o Grande Poeta, que este movimento gerará, deslocará para
segundo plano a figura até aqui principal de Camões”
A
citação transcrita aponta, logo de início, para o estado de desagregação em que
se encontra a Nação portuguesa e que, de algum modo, fará despoletar a ânsia de
renovação desejada por Fernado Pessoa e operacionalizada nos textos da
Mensagem.
Fernando
Pessoa acreditava que, através dos seus textos, poderia despertar as
consciências e fazê-las acreditar e desejar a grandeza outrora vivenciada.
Espera poder contribuir parar o reerguer da Pátria, relembrando, nas 1ª e 2ª
partes da Mensagem, o passado histórico grandioso e anunciando a vinda do
Encoberto (3ª parte), na figura mítica de D. Sebastião, que anunciaria o
advento do Quinto Império.
Preconizava
para Portugal a construção de um novo império, espiritual, capaz de elevar os
Portugueses ao lugar de destaque que outrora ocuparam a nível mundial. Esta
projecção ficar-se-ia a dever a um “poeta ou poetas supremos” que, pela sua
genialidade, colocariam Portugal, um país culturalmente evoluído, como líder de
todos os outros.
Na
realidade, Fernando Pessoa antevê a possibilidade da supremacia de Portugal,
não em termos materiais, como no tempo de Camões, mas em termos espirituais É
nesta nova concepção de Império que assenta o carácter simbólico e mítico que
enforma a epopeia pessoana e que, inevitavelmente, destacará a figura deste
superpoeta, em detrimento da de Camões.
O
Sebastianismo
O sebastianismo é um mito
nacional de tipo religioso.
«D. Sebastião voltará, diz a lenda, por uma manhã de névoa, no seu
cavalo branco...»
O
sebastianismo, fundamentalmente, o que é? É um movimento religioso, feito em
volta duma figura nacional, no sentido dum mito. No sentido simbólico D.
Sebastião é Portugal: Portugal que perdeu a sua grandeza com D. Sebastião, e
que só voltará a tê-la com o regresso dele, regresso simbólico ( como, por um
mistério espantoso e divino, a própria vida dele fora simbólica ( mas em que
não é absurdo confiar. D. Sebastião voltará, diz a lenda, por uma manhã de
névoa, no seu cavalo branco, vindo da ilha longínqua onde esteve esperando a
hora da volta. A manhã de névoa indica, evidentemente, um renascimento anuviado
por elementos de decadência, por restos da Noite onde viveu a nacionalidade.
ü
D. Sebastião não morreu porque os símbolos não
morrem. O desaparecimento físico de D. Sebastião proporciona a libertação da
alma portuguesa.
ü
D. Sebastião aparece cinco vezes explicitamente
na Mensagem (uma vez nas Quinas, outra em Mar português e três vezes nos
Símbolos).
Aliás, pode mesmo dizer-se que o Brasão e o Mar português são a preparação para a chegada do Encoberto, na sua qualidade de Messias de Portugal.
Aliás, pode mesmo dizer-se que o Brasão e o Mar português são a preparação para a chegada do Encoberto, na sua qualidade de Messias de Portugal.
D. Sebastião faz uma espécie de
elogio da loucura (condenação da matéria e sublimação do espírito)
A vinda do
Encoberto era apenas por ele encarada «no seu alto sentido simbólico» e não
literal, como faziam os Sebastianistas tradicionais, de quem toma distância, e
que esse Desejado não seria mais do que um «estimulador de almas
O
Quinto Império era afinal «o Império Português, subordinado ao espírito
definido pela língua portuguesa
O Quinto Império será «cultural», ou não
será. E se diz, como Vieira, que o Império será português, isso significa que
Portugal desempenhará um papel determinante na difusão dessa ideia apolínea e
órfica do homem que toda a sua obra proclama.
Os
Símbolos e os Mitos
q Estrutura
simbólica de Mensagem
Mensagem é a expressão poética dos
mitos – não se trata de uma narrativa sobre os grandes feitos dos portugueses
no passado, como em Os Lusíadas, mas sim, de um cantar de um Império de teor
espiritual, da construção de uma supra-nação, através da ligação
ocidente/oriente: não são os factos históricos propriamente ditos sobre os nossos
reis que mais importam; são sim as suas atitudes e o que eles representam,
sendo o assunto de Mensagem a essência de Portugal e a sua missão a cumprir.
Daí se interpretem as figuras dos reis nos poemas de Mensagem como heróis mas
mais que isso, como símbolos, de diferentes significados.
O três é um número que exprime a ordem
intelectual e espiritual (o cosmos no homem). O 3 é a soma do um (céu) e do
dois (a Terra). Trata-se da manifestação da divindade, é a manifestação da
perfeição, da totalidade.
O sete assume
também uma extrema relevância, senão vejamos, sete foram os Castelos que D.
Afonso III conquistou aos mouros, sete são os poemas de Os Castelos .
O sete corresponde aos
7 dias da criação, assim como as 7 figuras evocadas são também as fundadoras da
nacionalidade (Ulisses fundou Lisboa, Viriato uma nação, Conde D. Henrique um
Condado, D. Dinis uma cultura, D. João uma dinastia, D. Tareja e D. Filipa
fundaram duas dinastias). Pessoa manteve na sua obra a ideia do número sete
como número da criação. O sete é o número da perfeição dinâmica. É o número de
um ciclo completo.
O cinco está ligado às chagas de Cristo, às
Quinas e aos cinco impérios sonhados por Nabucodonosar. Os quatro impérios já
havidos foram a Grécia, roma, a Cristandade e a Europa pós-renascentista. Se o
5º império fosse material, Pessoa não teria dúvidas em apontar Inglaterra, mas
como o 5º Império é o do ser, da essência, do imaterial, o poeta não tem
dúvidas em apontar Portugal.
Também os nomes dados a cada parte e alguns nomes referidos
nos poemas são também simbólicos:
•
Brasão: o passado inalterável
•
Campo: espaço de vida de de acção
•
Castelo: refúgio e segurança
•
Quinas: chagas de Cristo – dimensão espiritual
•
Coroa: perfeição e poder
• Timbre:
marca – sagração do herói para missão transcendente
• Grifo:
terra e céu – criação de uma obra terrestre e celeste
• Mar:
vida e morte; ponto de partida; reflexo do céu; princípio masculino
• Terra:
casa do homem; espelho do céu; paraíso mítico; princípio feminino
• Padrão:
marco; sinal de presença; obra da civilização cristã
• Mostrengo:
o desconhecido; as lendas do mar; os obstáculos a vencer
• Nau:
viagem; iniciação; aquisição de conhecimentos
• Ilha:
refúgio espiritual; espaço de conquista; recompensa do sacrifício
• Noite:
morte; tempo de inércia; tempo de germinação; certeza da vida
• Manhã:
luz; felicidade; vida; o novo mundo
Nevoeiro: indefinição;
promessa de vida; força criadora; novo dia
Síntese
Temática da “Mensagem”
•
O mito é tudo: sem ele a realidade não existe, pois é
dele que ela parte
•
Deus é o agente da história; ou seja, é ele quem tem as
vontades; nós somos os seus instrumentos que realizam a sua vontade. É assim
que a obra nasce e se atinge a perfeição
•
O sonho é aquilo que dá vida ao homem: sem ele a vida
não tem sentido e limita-se à mediocridade
•
A verdadeira grandeza está na alma; É através do sonho
e da vontade de lutar que se alcança a glória
•
Portugal encontra-se num estado de decadência. Por
isso, é necessário voltar a sonhar, voltar a arriscar, de modo a que se possa
construir um outro império, um império que não se destrói, por não ser
material: é o Quinto Império, o Império Civilizacional-Espiritual.
•
D.Sebastião, além de ser o exemplo a seguir(pois
deixa-se levar pela loucura/sonho), é também visto como o salvador, aquele que
trará de novo a glória ao povo português e que virá completar o sonho,
cumprindo-se assim Portugal.
A
estrutura tripartida da “Mensagem”
1ª Parte – BRASÃO: o princípio da nacionalidade (em
que fundadores e antepassados criaram a pátria)
ü
“Ulisses” – símbolo da renovação dos
mitos: Ulisses de facto não existiu mas bastou a sua lenda para nos inspirar. A
lenda, ao penetrar na realidade, faz o milagre de tornar a vida “cá em baixo”
insignificante. É irrelevante que as figuras de quem o poeta se vai ocupar
tenham tido ou não existência histórica! (“Sem existir nos bastou/Por não ter
vindo foi vindo/E nos criou.”). O que importa é o que elas representam. Daí
serem figuras incorpóreas, que servem para ilustrar o ideal de ser português.
ü “D.
Dinis” – símbolo da importância da poesia na construção do Mundo: Pessoa vê
D. Dinis como o rei capaz de antever o futuro e interpreta isso através das
suas acções – ele plantou o pinhal de Leiria, de onde foi retirada a madeira
para as caravelas, e falou da “voz da terra ansiando pelo mar”, ou seja, do
desejo de que a aventura ultrapasse a mediocridade.
ü “D.
Sebastião, rei de Portugal” – símbolo da loucura audaciosa e aventureira: o
Homem sem a loucura não é nada; é simplesmente uma besta que nasce, procria e
morre, sem viver! Ora, D. Sebastião, apesar de ter falhado o empreendimento
épico, FOI em frente, e morreu por uma ideia de grandeza, e essa é a ideia que
deve persistir, mesmo após sua morte (“Ficou meu ser que houve, não o que
há./Minha loucura, outros que a tomem/Com o que nela ia.”)
2ª Parte
– MAR PORTUGUÊS: a realização através do mar (em que heróis empossados da
grande missão de descobrir foram construtores do grande destino da Nação)
ü
“O Infante” – símbolo do Homem universal,
que realiza o sonho por vontade divina: ele reúne todas as qualidades, virtudes
e valores para ser o intermediário entre os homens e Deus (“Deus quer, o homem
sonha, a obra nasce.”)
ü
“Mar Português” – símbolo do sofrimento
por que passaram todos os portugueses: a construção de uma supra-nação, de uma
Nação mítica implica o sacrifício do povo (“Ó mar salgado, quanto do teu
sal/São lágrimas de Portugal!”)
ü
“O Mostrengo” – símbolo dos obstáculos,
dos perigos e dos medos que os portugueses tiveram que enfrentar para realizar
o seu sonho: revoltado por alguém usurpar os seus domínios, “O Mostrengo” é uma
alegoria do medo, que tenta impedir os portugueses de completarem o seu destino
(“Quem é que ousou entrar/Nas minhas cavernas que não desvendo,/Meus tectos
negros do fim do mundo?”)
3ª Parte – O ENCOBERTO: a morte ou fim das energias
latentes (é o novo ciclo que se anuncia que trará a regeneração e instaurará um
novo tempo)
ü “O
Quinto Império” – símbolo da inquietação necessária ao progresso, assim
como o sonho: não se pode ficar sentado à espera que as coisas aconteçam; há que
ser ousado, curioso, corajoso e aventureiro; há que estar inquieto e
descontente com o que se tem e o que se é! (“Triste de quem vive em
casa/Contente com o seu lar/Sem um sonho, no erguer da asa.../Triste de quem é
feliz!”) O Quinto Império de Pessoa é a mística certeza do vir a ser pela lição
do ter sido, o Portugal-espírito, ente de cultura e esperança, tanto mais forte
quanto a hora da decadência a estimula.
ü “Nevoeiro”
– símbolo da nossa confusão, do estado caótico em que nos encontramos, tanto
como um Estado, como emocionalmente, mentalmente, etc.: algo ficou
consubstanciado, pois temos o desejo de voltarmos a ser o que éramos (“(Que
ânsia distante perto chora?)”), mas não temos os meios (“Nem rei nem lei, nem
paz nem guerra...”)
O
carácter épico-lírico
-
Lírico
§
Forma fragmentária
§
Atitude introspectiva
§
A interiorização
§
O simbolismo (3ªparte)
-
Épico:
§
O tom heróico (“O Monstrengo”)
§
A evocação da história Trágico-Marítima
(2ªparte)´
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