Álvaro de Campos
Álvaro de Campos surge quando Fernando Pessoa
sente “um impulso para escrever”. O próprio Pessoa considera que Campos se
encontra no «extremo oposto, inteiramente oposto, a Ricardo Reis”, apesar de
ser como este um discípulo de Caeiro.
Campos é o “filho indisciplinado da sensação
e para ele a sensação é tudo. O sensacionismo faz da sensação a realidade da
vida e a base da arte. O eu do poeta
tenta integrar e unificar tudo o que tem ou teve existência ou possibilidade de
existir.
Este heterónimo aprende de Caeiro a urgência de sentir, mas não lhe
basta a «sensação das coisas como são»: procura a totalização das sensações e
das percepções conforme as sente, ou como ele próprio afirma “sentir tudo de
todas as maneiras”.
Engenheiro naval e viajante, Álvaro de Campos é figurado
“biograficamente” por Pessoa como vanguardista e cosmopolita, espelhando-se
este seu perfil particularmente nos poemas em que exalta, em tom futurista, a
civilização moderna e os valores do progresso.
Cantor do mundo moderno, o poeta procura incessantemente “sentir tudo
de todas as maneiras”, seja a força explosiva dos mecanismos, seja a
velocidade, seja o próprio desejo de partir. “Poeta da modernidade”, Campos
tanto celebra, em poemas de estilo torrencial, amplo, delirante e até violento,
a civilização industrial e mecânica, como expressa o desencanto do quotidiano
citadino, adoptando sempre o ponto de vista do homem da cidade.
O drama de Álvaro Campos concretiza-se num
apelo dilacerante entre o amor do mundo e da humanidade; é uma espécie de
frustração total feita de incapacidade de unificar em si pensamento e
sentimento, mundo exterior e mundo interior. Revela, como Pessoa, a mesma
inadaptação à existência e a mesma demissão da personalidade íntegra., o
cepticismo, a dor de pensar e a nostalgia da infância.
Biografia
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Nasce em Tavira, em 1890
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Estuda engenharia mecânica e naval na Escócia
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“Filho indisciplinado da sensação e para ele a
sensação é tudo. O sensacionismo faz da sensação a realidade da vida e a base
da arte.”
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“Sentir tudo de todas as maneiras”
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Vanguardista e cosmopolita
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Único heterónimo que comparticipa da vida extra
literária de Fernando Pessoa heterónimo
Fases
Primeira – decadentismo (1914)
Eprime o tédio, o cansaço e a necessidade de
novas sensações (“Opiário”); o decadentismo surge como uma atitude estética
finissecular que exprime o tédio, o enfado, a náusea, o cansaço, o abatimento e
a necessidade de novas sensações. Traduz a falta de um sentido para a vida e a
necessidade de fuga à monotonia. Com rebuscamento, preciosismo, símbolos e
imagens apresenta-se marcado pelo Romantismo e pelo Simbolismo.
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Tédio, cansaço, necessidade de novas sensações
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Falta de um sentido para a vida
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Romantismo e simbolismo
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Nostalgia
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Saturação
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Embriaguez do ópio
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Horror à vida
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Realismo satírico
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Vocabulário precioso e vulgar
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Imagens
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Símbolos
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Estilo confessional brusco
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Decassílabos agrupados em quadras
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“Opiário “
Segunda – Futurismo (1914 a 1916)
Nesta fase, Álvaro de Campos celebra o triunfo
da máquina, da energia mecânica e da civilização moderna. Sente-se nos poemas
uma atracção quase erótica pelas máquinas, símbolo da vida moderna. Campos
apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina por
oposição à beleza tradicionalmente concebida. Exalta o progresso técnico, essa
“nova revelação metálica e dinâmica de Deus”. A “Ode Triunfal” ou a “Ode
Marítima” são bem o exemplo desta intensidade e totalização das sensações. A
par da paixão pela máquina, há a náusea, a neurastenia provocada pela poluição
física e moral da vida moderna.
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Elogio da civilização industrial e da técnica
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Triunfo da máquina, beleza dos “maquinistas em
fúria”
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Intelectualização das sensações, delírio
sensorial
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Não aristotélica
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Sado masoquismo
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Cantar lúcido do mundo moderno
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Influência de Walt Whitman
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Vertigem das sensações modernas
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Volúpia da imaginação
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Hipertrofia ilimitada do eu
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Energia explosiva
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Impulsos inconscientes
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Verso livre, longo
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Estilo esfuziante, torrencial
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Anáforas, exclamações, interjeições, apóstrofes
e enumerações
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Fantasia verbal
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Volúpia de ser objecto
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Vítima
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Dispersão
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“Ode triunfal”
Terceira fase –
pessoal ou intimista (1916 a 1935)
Perante a incapacidade das realizações, traz
de volta o abatimento, que provoca “Um supremíssimo cansaço, /íssimo, íssimo,
íssimo, /Cansaço…”. Nesta fase, Campos sente-se vazio, um marginal, um
incompreendido. Sofre fechado em si mesmo, angustiado e cansado. (“Esta velha
angústia”; “Apontamento”; “Lisbon revisited”).
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Melancolia
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Devaneio
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Cosmopolitismo
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Cepticismo
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Dor de pensar
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Saudades da Infância ou do Irreal
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Dissolução do eu
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Conflito entre a realidade e o poeta
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Cansaço, tédio e abulia
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Angustia existencial
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Solidão
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“Aniversário” e a “Tabacaria”
Traços da
sua poesia
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Poeta modernista
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Poeta sensacionista
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Cultor das sensações sem limite
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Poeta de verso livre
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Poeta de angustia existencial e da auto ironia
Traços estilísticos
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Verso livre em geral muito longo
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Assonâncias, onomatopeias, aliterações
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Grafismos expressivos
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Mistura de níveis de língua
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Enumerações excessivas, exclamações,
interjeições e pontuação emotiva
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Desvios sintácticos
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Estrangeirismos e neologismos
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Subordinação de fonemas
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Construções nominais, infinitivas e gerundivas
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Metáforas ousadas, oximoros, personificações, hipérboles
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Estética não aristélica na fase futurista.
Quadro-Síntese:
Temáticas
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Estilísticas
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Apologia da civilização mecânica, da indústria, da
técnica (futurismo e sensacionismo): tentativa de romper com o subjectivismo
da lírica tradicional
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Atitude escandalosa, chocante: trangressão de uma
atitude moral estabeleciada
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Traços de anti-filosofia e anti-poesia
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Sadismo e masoquismo
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Ilusão: sonho; retorno impossível à infância; viagem
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Mais evolutivo que qualquer dos outros heterónimos
(três fases)
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Última fase: conflito realidade/poeta: cansaço
existencial, náusea, tédio, abulia; estranheza da realidade solidão;
isolamento; dissolução do “eu”; ritmo lento
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Exclamação, apóstrofe repetida, interjeição, gradação
(ascendente e descendente)
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Repetição, simetria de construção, assonância, aliteração,
rima interior, enumeração desordenada, polissíndeto
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Construções nominais e infinitivas
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Verso livre e, em geral, muito longo ( duas ou três
linhas) e com encavalgamento
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Onomatopeia
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Grafismo inovador
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Oxímoro
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Uso expressivo da pontuação: exclamação,
interrogação, reticências
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Estrangeirismos, neologismos e susbstantivação de
fonemas
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Metáfora, personificação e hipérbole
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